sábado, 14 de agosto de 2010

vão embora,

Em algum momento, em vários deles ou definitivamente, as pessoas sempre vão embora. Talvez essa seja a pior coisa do mundo. Ele vai embora, sempre, quando eu preciso de quinze minutos de silêncio complementar à minha entrega, odeio o desespero dele por banhos e a sua ansiedade curiosa pelo que vem depois. Que se dane o depois, eu sou agora, ou pelo menos era.

Ele vai embora, sempre, quando o parágrafo passa de três linhas, o pensamento dele ultrapassa meus olhos, o som se perde da minha boca para qualquer outro canto do mundo que não tenha seus ouvidos e ele olha fixamente para qualquer outra coisa que não seja a minha existência. Sempre a mesma cara de tédio e de busca pelo resto que não se repete ou não se prolonga. Ele sempre vai embora quando eu queria que ele se perdesse um pouco mais, rasgasse a agenda, lançasse o celular no rio, desligasse todos os toques, luzes e sinais de que há todo o resto. Esquecesse do sono, do livro, da planta, das lembranças. Ele sempre vai embora do meu mundo quando eu só queria que ele descansasse um pouco de ser ele o tempo todo, mas ele tem muito medo de não ser ele, talvez porque ele não saiba o que ele é.

Ele sempre vai embora, ele é o mesmo de sempre que não sabe quem é, o que quer. Vivo com essa sensação de abandono, de falta, de pouco, de metade. Mas nada disso é novidade. Eu não sei deixar ninguém partir, eu não sei escolher, excluir, deletar. São as pessoas que resolvem me deixar, melhor assim, adoro não ser responsável por absolutamente nada, odeio o peso que uma despedida eterna causa em mim. Nada é eterno, não quero brincar de Deus.

O nosso pra sempre pode durar duas horas, dois anos ou duas encarnações. A gente sempre se despede lembrando de alguma música. Ele não me ama, porém quando esta comigo não lembra que ama ninguém, talvez porque não ame ninguém o suficiente, talvez porque ele não saiba quem ele é, o que ele quer. Um dia apareceu a outra. Mas a última vez que ele foi embora, antes me deu um abraço de quem nunca saiu do mesmo lugar. O abraço e o seu olhar de quem nunca sabe direito porque vai embora ficaram pra sempre comigo.

Fazia tempo que alguém não ficava tão calado enquanto eu apenas existia, fazia tempo que alguém não ficava tão perdido só porque me encontrou, fazia tempo que eu não me olhava no espelho e sorria.

Todo mundo chega na sua vida. Em algum momento, em vários deles ou definitivamente, as pessoas sempre chegam. Talvez essa seja a melhor coisa do mundo. Como naquele texto que não lembro, daquela pessoa que não lembro, e sobre o qual você me contou de um jeito que eu nunca mais vou esquecer, no final a gente acaba mesmo numa esquina qualquer. E depois eu vivo com a lembrança de alguém que um dia chegou e depois foi embora.


Texto da série: Textos para serem lidos mil vezes. ( porém, eu editei para se encaixar no meu eu )

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